Estatal deve diversificar serviços e investir no segmento de encomendas
Fabiano Silva dos Santos
Presidente dos Correios
Editorial desta Folha (“O futuro dos Correios”, 26/3) trouxe à tona o debate sobre a privatização da empresa. A fim de esclarecer os principais pontos elencados, apresentamos dados relevantes.
A Constituição estabelece que compete à União manter o serviço postal. O objetivo é não permitir que o direito à comunicação e ao sigilo da correspondência fique sujeito a interesses de mercado. Por esse mesmo motivo, a privatização do setor não é tendência no mundo: apenas oito países têm correios privados, como, por exemplo, Holanda, Reino Unido e Suécia. Nenhum país das dimensões do Brasil discute o tema.
Em Portugal, a privatização em 2013 gerou reclamações sobre perda de qualidade e aumento de preços. Na Argentina, terminou com a falência da empresa, a reestatização e um rombo para o Estado —uma conta a mais para os contribuintes. Nem mesmo os Estados Unidos, exemplo de sucesso do livre mercado, privatizam o serviço, ainda que tenham registrado prejuízos acumulados de quase US$ 90 bilhões de 2006 a 2020.
Esse não é o caso do Brasil. Apesar do prejuízo de 2022, os Correios possuem caixa para enfrentar os desafios, consolidado por 16 anos de lucro entre 2001 e 2020, com resultado líquido positivo de R$ 12,4 bilhões e repasse de R$ 9 bilhões para a União. Na prática, isso significa que o contribuinte não é onerado para manter a estatal.
Com a privatização preconizada pela Folha, a União assumiria os serviços postais em locais distantes ou pequenos, pois o mercado não possui estrutura ou interesse em levar documentos e encomendas a cidades do interior —o que a estatal, presente em todos os municípios, alcança a preço acessível. Por todos esses motivos, o presidente Lula, ao ser empossado, suspendeu imediatamente o processo de privatização, incumbindo à nossa gestão, iniciada em fevereiro, a missão de fortalecer os Correios.
A Folha acerta quando diz que “a oportunidade está no segmento de encomendas, que avança com o comércio eletrônico e exige investimentos em tecnologia e logística”. Estamos cientes, e nas próximas semanas apresentaremos um plano de ações de curto e médio prazo com iniciativas para diversificar serviços, realizar parcerias e aumentar receitas a fim de manter e ampliar a liderança dos Correios no segmento, que é concorrencial e envolve players como gigantes multinacionais.
Nossa diretriz é investir fortemente em tecnologia e inovação, ao contrário da gestão anterior, que teve essa oportunidade e não o fez, com a clara intenção de privatizar a estatal. Como bem anotado pela Folha, foram apenas R$ 202 milhões destinados em 2022 para TI. Com o aporte de recursos para áreas estratégicas, iremos valorizar e modernizar a estatal, consolidando-a como a empresa de logística mais eficiente da América Latina.
Por 360 anos, os Correios têm atuado para a integração nacional e o desenvolvimento do Brasil. Nossa gestão trabalha para diversificar e atualizar o portfólio, aprimorar a qualidade e conquistar novas receitas a fim de corresponder à confiança da população, que considera a estatal a empresa pública mais respeitada do país.
Artigo publicado na coluna Tendências e Debate, do jornal Folha de São Paulo, em 2/4/2023.